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quarta-feira, 21 de maio de 2014

FACEBOOK

Os Homens já não têm tempo para tomar conhecimento de nada. Compram coisas feitas aos mercadores. Mas como não existem mercadores de amigos, os Homens já não têm amigos. Esta reflexão de Antoine de Saint-Exupéry (O Pequeno Príncipe, 1942) é hoje desmentida pelos fatos. Atualmente, os mercadores de amigos existem.
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À primeira vista a coisa parece inocente. Inscreve-se em um site de livre escolha e assim se possui um endereço, um perfil no qual se apresenta a própria identidade e os próprios interesses. Depois, atualiza-se esta apresentação eletrônica e se adicionam fotos recentes, relatórios de atividades, desejos e projetos. O conjunto é enviado para uma rede de conhecidos que tem livre acesso a estas informações. A esse ponto, fica fácil fazer amizade e entrar na vida privada dos outros.
O fenômeno suscita muitas dúvidas para o cristão, como sobre os bate-papos inúteis (chat), por exemplo, sobre a curiosidade, sobre o tempo roubado ao próprio dever de estado ou à vida de oração. Mas vamos limitar-nos à seguinte questão: Estas redes sociais (FacebookMySpace, etc.) mantêm suas promessas? Podemos fazer nelas amizades verdadeiras?

FALSOS AMIGOS

O que é amizade? Com Aristóteles, os filósofos definem a amizade com três elementos: a semelhança, benevolência e a reciprocidade. O que acontece com tais elementos nestas redes sociais?
Toda verdadeira amizade é fundada sobre certa semelhança, sobre a posse comum de uma série de sentimentos, julgamentos e vontades. Este é o tesouro comum que irá determinar a verdade e a nobreza da amizade. Se, em vez disso, baseia-se na sensualidade ou na mentira, será apenas uma caricatura. Se for construída sobre a vida de graça e o desejo de agradar a Deus, será uma verdadeira e bela amizade.
Agora, em que se baseiam as relações no Facebook? Em uma espécie de mentira. O sociólogo Dominique Cardon demostra que com o Facebook se desenvolve a “dramatização” de si mesmo, o que os ingleses chamam de show off. No mais das vezes, as pessoas se mostram nuas ou em situações humilhantes. Sobretudo, e geralmente em grupo, as pessoas se mostram à mesa, no trabalho, com raiva ou bêbados em uma festa. Toda vez se manda à comunidade a mesma mensagem: “Eu tenho uma vida badalada, saio muito, sei me divertir, conheço um monte de gente, seja como eu”. Tentamos mostrar aos outros que somos jovens, bonitos, “cool” [legais] e que é bom fazer parte dos contatos. Em resumo, não se perde ocasião de vangloriar-se, arriscando-se a passar por mitômanos.
Uma das provas de que a imagem que se dá de si é falsa está no fato de que nunca se mostra tristeza. Nas fotos, se sorri, se mostra a língua, apoia-se nos ombros dos amigos, se comemora, mas nunca se mostra uma lágrima. Portanto, ninguém nunca se revela totalmente, a identidade que se mostra é construída e artificial, e a amizade que resultará disso também o será.
O segundo elemento de amizade é a benevolência, a benevolentia latina, a vontade do bem do outro. A amizade é toda orientada para o verdadeiro bem do meu amigo e não para meus interesses e o meu prazer. O que tem de benevolente nas “amizades” que prometem as redes sociais?
Em primeiro lugar, precisa saber que um em cada cinco usuários de Facebook utiliza esta rede para encontrar uma vítima para seus próprios maus desejos. Enquanto que mesmo os que têm boas intenções a toda evidência se inscrevem em tais redes para si e não para os outros. Eu torno públicas certas partes de minha vida para torná-las conhecidas e validá-las em meu círculo. Cultivo a ilusão de não ser esquecido, de ser uma pessoa importante e amada. Substituo a satisfação de ter uma pessoa que pensa em mim sempre pela ideia de que muitas pessoas pensam em mim um pouco. Em última análise, tudo está centrado no eu.
Além disso, tal ostentação da própria vida privada comporta outro perigo, o de uma contínua solicitação ao mal. Nas redes sociais, eu vejo o que os outros podem fazer sem mim e eu me descubro muito estúpido para ficar fora do “o que os outros fazem”. Vejo o que me falta para estar completamente na moda e me sinto compelido a fazer mais.
Neste ponto, o que acontece com a gratidão, a generosidade, a reciprocidade, que formam o terceiro elemento da amizade?
Os utilizadores aprendem logo. “Eu tenho 100 amigos no Facebook – escreve um deles – mas na mesa almoço sozinho”. “Eu tenho 257 amigos no Facebook – outro reclama – mas ninguém que me ajude com a mudança”. É a diferença entre a quantidade e a qualidade, entre as relações artificiais e a vida real. No Facebook, a amizade é recompensada com um “click” que não custa nada, com alguma piada grosseira, com algumas novidades descobertas no mural de alguém (o que alguém comeu no almoço, como se vestiu esta manhã a senhorita, tudo acompanhado de fotos). Sobretudo, as relações dos usuários de Facebook recaem no voyeurismo, porque se eu conto sobre mim é justamente para despertar a curiosidade nos meus “amigos”. Que sentido faz brincar de esconde-esconde se ninguém me procura? Graças ao Facebook, não precisa mais espiar pelo buraco da fechadura, a minha vida e a dos contatos da minha rede são visíveis a todos. “No Facebook você se comporta como um porteiro”, diz um psiquiatra. É neste nível que se coloca essa estranha amizade.
Definitivamente, as redes sociais destroem um dos elementos mais bonitos e mais consoladores da vida humana, a verdadeira amizade.