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quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

COMONITÓRIO: REGRAS PARA CONHECER A FÉ VERDADEIRA - SÃO VICENTE DE LERINS

Prefácio 
por dom Lourenço Fleichman, OSB


     Quando a tirania sobe ao poder, precisa dar-se meios de governar aqueles que deverão se submeter. Para isso, pode proceder por meio das armas, da violência e da perseguição, ou, por outro lado, por meio de métodos de persuasão mais ou menos enganosos.
     Algo semelhante ocorreu no mundo católico com o advento do progressismo, a partir do Concílio Vaticano II. De tal forma as novidades deste Concílio foram impostas que é lícito falar de tirania religiosa. Uma tirania do pensamento, uma tirania do governo, uma tirania da mediocridade; o conjunto pode ser resumido como a destruição da santidade.
    Enquanto a obra de Vaticano II eliminava, na prática, toda reação mais explícita contra as novidades de um catolicismo naturalista e laicizado, perseguindo os prelados e padres fiéis à Tradição, ela procedia, paralelamente, a um trabalho constante de persuasão daqueles que se deixavam docemente conduzir à nova religião que inventaram.
    Esta obra nefasta atinge o próprio pensamento católico através da mudança de doutrina em praticamento todos os pontos do catolicismo, ataca os vasos capilares do organismo religioso, estabelecendo mudanças de comportamento, de atitudes, de linguagem, que mostram a profundidade da crise do catolicismo. Ser católico hoje já não corresponde ao que se entendia por essa expressão até os anos que precederam o Concílio Vaticano II. Esta dicotomia que separou os católicos em dois campos antagônicos manisfesta-se, assim, tanto na doutrina que é ensinada como no modo de agir: vemos surgir certa esquerda "católica" pregando uma "libertação" que não vem de Deus, mas da Revolução: falam do ódio, da riqueza material, da força militar contra o que eles chamam de opressão; levantam o punho cerrado, vestem-se de guerrilheiros e mentem sem escrúpulos. Reagindo contra esse lado político surgem os carismáticos imitadores dos protestantes, com seus gritos, palmas, desmaios e curas, numa manifestação hiper-sentimental que foge completamente da verdadeira Religião.     Cimentando os dois lados contrários entre si, aparece como regra máxima um certo juridismo eclesiástico que estabelece na obediência às regras deles, a marca essencial do novo catolicismo. Até as vésperas de Vaticano II, a essência da Igreja Católica estava nas quatro notas que designam a verdadeira Igreja de Cristo como sendo Una, Santa, Católica e Apostólica. Subvertendo o significado dessas notas essenciais, os progressistas do pós-Vaticano II darão nova interpretação a elas, confundindo a cabeça do povo fiel que terminará por aceitar as novas regras por medo de se achar fora da Igreja. Ora, essa é a atitude de todo tirano. Uma vez conquistado o poder, puxam a espada e obrigam os súditos a uma obediência ferrenha, mas esvaziada da seiva da verdade.
    Diante de um quadro tão devastador tornou-se urgente dar aos católicos critérios de análise da doutrina ensina por seus pastores e pela enxurrada de livros e textos de internet publicados como o pretenso selo do catolicismo. Do mesmo modo, é preciso indagar a antiguidade a propósito dos costumes hoje espalhados por todo o mundo, pelos quais os batizados manifestam um sentimentalismo jamais aceito pela Igreja. Estes critérios existem há séculos, pois as heresias surgiram desde o início da vida da Igreja. Foram escritos e ensinados por santos e doutores, homens doutos e sábios que perceberam serem os fiéis, em geral, presas fáceis da astúcia dos tiranos. Um desses Santos foi São Vicente de Lerins. Neste livrinho que vocês lerão agora, descortina-se um método eficaz para se guardar a fé em tempos de crise do pensamento, em tempos de crise da própria fé. Nele vocês encontrarão o famoso cânon de São Vicente: quod ubique, quod semper, quod ab omnibus - o que em toda parte, sempre e por todos foi ensinado - isso é de fé católica. O resto é invenção dos homens e deve ser descartado.
    Pouco acostumados com a linguagem dos Padres da Igreja, nossos leitores talvez considerem estas páginas demais simples. Não se equivoquem. A linguagem simples e acessível só confirma a antiguidade do texto e a santidade do autor. Dentro dessa aparência de coisa simples esconde-se a mais alta sabedoria e o amor de Deus. Leiam e releiam esta doutrina santa, aprovada por todos os papas anteriores ao Concílio. Apliquem seu ensinamento ao que hoje é ensinado por esse progressismo e vejam, assim, como proceder para guardar a fé no meio dessa grande heresia modernista que nos assola, que nos persegue e tenta arrancar de vez a fé dos nossos corações.