Os
Homens já não têm tempo para tomar conhecimento de nada. Compram coisas feitas
aos mercadores. Mas como não existem mercadores de amigos, os Homens já não têm
amigos”. Esta
reflexão de Antoine de Saint-Exupéry (O Pequeno Príncipe, 1942) é hoje
desmentida pelos fatos. Atualmente, os mercadores de amigos existem.
[...]
À
primeira vista a coisa parece inocente. Inscreve-se em um site de livre escolha
e assim se possui um endereço, um perfil no qual se
apresenta a própria identidade e os próprios interesses. Depois, atualiza-se
esta apresentação eletrônica e se adicionam fotos recentes, relatórios de
atividades, desejos e projetos. O conjunto é enviado para uma rede de
conhecidos que tem livre acesso a estas informações. A esse ponto, fica fácil
fazer amizade e entrar na vida privada dos outros.
O
fenômeno suscita muitas dúvidas para o cristão, como sobre os bate-papos
inúteis (chat), por exemplo, sobre a curiosidade, sobre o tempo roubado
ao próprio dever de estado ou à vida de oração. Mas vamos limitar-nos à
seguinte questão: Estas redes sociais (Facebook, MySpace,
etc.) mantêm suas promessas? Podemos fazer nelas amizades verdadeiras?
FALSOS
AMIGOS
O
que é amizade? Com Aristóteles, os filósofos definem a amizade com três
elementos: a semelhança, benevolência e a reciprocidade. O que acontece com
tais elementos nestas redes sociais?
Toda
verdadeira amizade é fundada sobre certa semelhança, sobre a posse comum de uma
série de sentimentos, julgamentos e vontades. Este é o tesouro comum que irá
determinar a verdade e a nobreza da amizade. Se, em vez disso, baseia-se na
sensualidade ou na mentira, será apenas uma caricatura. Se for construída sobre
a vida de graça e o desejo de agradar a Deus, será uma verdadeira e bela
amizade.
Agora,
em que se baseiam as relações no Facebook? Em uma espécie de
mentira. O sociólogo Dominique Cardon demostra que com o Facebook se
desenvolve a “dramatização” de si mesmo, o que os ingleses chamam de show
off. No mais das vezes, as pessoas se mostram nuas ou em situações
humilhantes. Sobretudo, e geralmente em grupo, as pessoas se mostram à mesa, no
trabalho, com raiva ou bêbados em uma festa. Toda vez se manda à comunidade a
mesma mensagem: “Eu tenho uma vida badalada, saio muito, sei me divertir,
conheço um monte de gente, seja como eu”. Tentamos mostrar aos outros que somos
jovens, bonitos, “cool” [legais] e que é bom fazer parte dos contatos. Em
resumo, não se perde ocasião de vangloriar-se, arriscando-se a passar por
mitômanos.
Uma
das provas de que a imagem que se dá de si é falsa está no fato de que nunca se
mostra tristeza. Nas fotos, se sorri, se mostra a língua, apoia-se nos ombros
dos amigos, se comemora, mas nunca se mostra uma lágrima. Portanto, ninguém
nunca se revela totalmente, a identidade que se mostra é construída e
artificial, e a amizade que resultará disso também o será.
O
segundo elemento de amizade é a benevolência, a benevolentia latina,
a vontade do bem do outro. A amizade é toda orientada para o verdadeiro bem do
meu amigo e não para meus interesses e o meu prazer. O que tem de benevolente
nas “amizades” que prometem as redes sociais?
Em
primeiro lugar, precisa saber que um em cada cinco usuários de Facebook utiliza
esta rede para encontrar uma vítima para seus próprios maus desejos. Enquanto
que mesmo os que têm boas intenções a toda evidência se inscrevem em tais redes
para si e não para os outros. Eu torno públicas certas partes de minha vida
para torná-las conhecidas e validá-las em meu círculo. Cultivo a ilusão de não
ser esquecido, de ser uma pessoa importante e amada. Substituo a satisfação de
ter uma pessoa que pensa em mim sempre pela ideia de que muitas pessoas pensam
em mim um pouco. Em última análise, tudo está centrado no eu.
Além
disso, tal ostentação da própria vida privada comporta outro perigo, o de uma
contínua solicitação ao mal. Nas redes sociais, eu vejo o que os outros podem
fazer sem mim e eu me descubro muito estúpido para ficar fora do “o que os
outros fazem”. Vejo o que me falta para estar completamente na moda e me sinto
compelido a fazer mais.
Neste
ponto, o que acontece com a gratidão, a generosidade, a reciprocidade, que
formam o terceiro elemento da amizade?
Os
utilizadores aprendem logo. “Eu tenho 100 amigos no Facebook –
escreve um deles – mas na mesa almoço sozinho”. “Eu tenho 257 amigos no Facebook –
outro reclama – mas ninguém que me ajude com a mudança”. É a diferença entre a
quantidade e a qualidade, entre as relações artificiais e a vida real. No Facebook,
a amizade é recompensada com um “click” que não custa nada, com alguma piada
grosseira, com algumas novidades descobertas no mural de alguém (o que alguém
comeu no almoço, como se vestiu esta manhã a senhorita, tudo acompanhado de
fotos). Sobretudo, as relações dos usuários de Facebook recaem
no voyeurismo, porque se eu conto sobre mim é justamente para despertar a
curiosidade nos meus “amigos”. Que sentido faz brincar de esconde-esconde se
ninguém me procura? Graças ao Facebook, não precisa mais espiar pelo
buraco da fechadura, a minha vida e a dos contatos da minha rede são visíveis a
todos. “No Facebook você se comporta como um porteiro”, diz um
psiquiatra. É neste nível que se coloca essa estranha amizade.
Definitivamente,
as redes sociais destroem um dos elementos mais bonitos e mais consoladores da
vida humana, a verdadeira amizade.